Com a publicação da Lei 14.711, em 30 de outubro de 2023, chamada “Marco Legal das Garantias”, foram aprimoradas e inovadas as regras relativas às garantias dadas por devedores, especialmente envolvendo alienação fiduciária e na hipoteca.

Para a alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, houve alterações importantes no texto da Lei nº 9.514/1997. Lembre-se que a referida Lei assegura ao devedor dar em garantia do pagamento de dívida, imóvel de sua propriedade, transferindo-se a propriedade fiduciária ao credor e permanecendo o devedor como possuidor direto do bem até a quitação integral da dívida. No caso de inadimplemento, inicia-se a excussão extrajudicial do bem imóvel, cuja constitucionalidade foi reforçada em recente decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 860.631 (SP), com repercussão geral (Tema 982).

Dentre as mudanças introduzidas com o Marco Legal das Garantias destaca-se a possibilidade de um bem imóvel ser dado em alienação fiduciária a mais de um credor. Nessa hipótese a garantia segue uma ordem cronológica, ou seja, as anteriores têm prioridade no recebimento dos valores em relação às seguintes, permanecendo os direitos dos demais credores fiduciários sub-rogados na parte do preço obtido que não foi utilizada para pagamento da dívida anterior.

Quaisquer dos credores fiduciários que realizarem o pagamento da dívida do devedor comum será sub-rogado no crédito e na propriedade em garantia, assim como já ocorre para terceiros ou fiadores que pagarem a dívida.

Houve ainda definições importantes para viabilizar a intimação por edital, que só é possível se o devedor ou o terceiro fiduciante estiverem em local ignorado, incerto ou inacessível: (i) é de responsabilidade do devedor e dos demais fiduciários informar ao credor a alteração de seu domicílio, podendo-se, na ausência de comunicação, interpretar-se como indicativo de se estar em local incerto; (ii) será considerado local ignorado quando o devedor e os terceiros fiduciantes não forem localizados em seus últimos domicílios informados no contrato e no imóvel e, se houver sido o fornecido em contrato o contato eletrônico, o credor fiduciário deverá enviar intimação por essa via, com antecedência da realização de intimação por edital; (iii) em caso de recusa ou inexistência de funcionário responsável pelo recebimento da intimação, será considerado o local como inacessível.

Se a dívida for garantida por mais de um imóvel matriculados em Cartórios de Registro de Imóveis diversos, a intimação para purgação da mora poderá ser solicitada em qualquer um deles, e para que seja válido, o credor deverá informar a totalidade da dívida e os bens dados em garantia, podendo ser executadas simultaneamente ou sucessivamente até a quitação integral da dívida, desde que não haja vinculação de dívida por imóvel.

Importante, também, a expressa menção na nova redação de que os direitos reais de garantia ou ônus (penhoras, indisponibilidades, etc.) não obstam a consolidação da propriedade ao credor fiduciário, ficando estes na “fila” para o recebimento do saldo que eventualmente exista no produto da venda.

Outra alteração importantíssima é a ausência da quitação automática em caso da dívida ser superior ao valor do bem excutido. Agora, diferentemente do que constava na legislação anterior, o imóvel poderá ser leiloado em segunda praça não somente pelo valor da dívida, mas sim por valor equivalente a 50% de sua avaliação, entrando na regra do preço vil do Código de Processo Civil. Existindo saldo remanescente, o credor poderá cobrar via execução judicial, ou se o caso, executando as demais garantias da dívida.

Além do acima exposto, pela nova Lei a reintegração de posse não pode ser obstada por ações judiciais relacionadas ao Contrato de Alienação Fiduciária em Garantia ou requisitos normativas da cobrança e leilões, exceto a notificação do devedor, sendo esta questão consolidada hoje pela resolução em perdas e danos.

A Lei 14.711/23 alterou também o Decreto-Lei nº 70, de 21 de novembro de 1966, que trata da hipoteca (outra forma de garantia real), com a revogação dos artigos que tratavam da sua forma de excussão, para incluir as novas regras de execução extrajudicial.

O procedimento de execução extrajudicial da hipoteca, agora, aproximou-se do rito previsto nas hipóteses de alienação fiduciária, porque o bem também passa a ser excutido no Registro de Imóveis, havendo a necessidade de intimação dos devedores e eventuais terceiros garantidores, e em caso de segundo leilão também poderá ser aceito o valor de 50% de avaliação do bem.

Por fim, o “Marco Legal das Garantias” trouxe a possibilidade da extensão da garantia real a novas operações de crédito; a consolidação da existência da figura do agente de garantia; e ainda definiu que na execução extrajudicial da garantia imobiliária em concurso de credores que habilitem seu crédito após a comunicação do oficial de registro de imóveis, o critério terá prioridade, respeitando-se a anterioridade.

 

Confira a íntegra da Lei:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14711.htm